“ASSUSTADORA POBREZA”

Os bispos católicos angolanos consideraram hoje que se verifica em Angola um “perigoso vazio de diálogo” entre “governantes e governados” e entre as lideranças partidárias, o que “eleva o radicalismo e intolerância”, num contexto de “assustadora” pobreza. Também defendem “verdade, justiça e transparência” na preparação das eleições gerais, previstas para Agosto próximo, e exortaram todos os cidadãos a participarem do processo com “alto sentido de responsabilidade” e a “evitarem absentismo”.

Na abertura da primeira assembleia plenária da Conferência Episcopal de Angola e São Tomé (CEAST), o presidente da organização, José Manuel Imbamba, afirmou que há, em Angola, uma “evidente degradação dos hábitos e costumes do comportamento social, das atitudes e do civismo” e verifica-se “um perigoso vazio entre os governantes e governados, entre as lideranças partidárias e entre os vários actores cívicos”.

“Elevando ainda mais os níveis de ansiedade, de radicalismo, intolerância, indisciplina, violência física, verbal, moral e psicológica”, afirmou o prelado na abertura da assembleia que decorre até 7 de Fevereiro, na província de Benguela.

Para José Manuel Imbamba, os meios de comunicação social, sobretudo públicos, “também estão a contribuir para o actual ambiente sombrio e nefasto” cujo desempenho, notou, “em nada contribui para a harmonia social, paz dos espíritos, para cultura do diálogo, da democracia e da fraternidade social”.

“Daí o meu apelo à serenidade, ponderação, abertura de espírito e ao acolhimento e aceitação mútua em nome da pátria, em nome de Angola. Que os partidos não sejam mais importantes do que o país e as bandeiras partidárias que inundam as aldeias não suplantem a bandeira da República”, exortou.

O também arcebispo de Saurimo defendeu, na sua intervenção, a necessidade de se “ter coragem de encarar e curar com verdade as causas dos nossos problemas para evitarmos soluções fugazes e com pouco impacto na vida normal dos cidadãos”.

O presidente da CEAST assinalou igualmente a problemática da seca e a consequente fome que “continuam a ser um drama” para milhares de famílias no Sul de Angola, enaltecendo, no entanto, as acções locais desenvolvidas pelo Governo.

A decisão e determinação em “continuar a breve, médio e longo prazo com os projectos, alguns já em curso, de construção para a garantia de água constitui sem dúvida um sinal de esperança em dias melhores para as comunidades daquela parcela do nosso território”, notou.

“Que tudo seja feito no sentido de se caminhar neste sentido, ao mesmo tempo que não se prescinda de uma resposta rápida e regular para minimizar a fome dos nossos irmãos através de declarações de estado de crise, nas suas possíveis variantes, campanhas permanentes de recolha de alimentos por parte de organizações civis e pessoas singulares, sem aproveitamentos políticos”, frisou.

A vida pastoral da Igreja Católica angolana e a condição sociopolítica e económica do país são alguns dos pontos que vão nortear os trabalhos dos bispos católicos, que devem igualmente produzir uma nota pastoral sobre as próximas eleições gerais.

Em Benguela, bispos católicos vão igualmente prestigiar a cerimónia de sagração episcopal do padre Estêvão Binga, a bispo auxiliar de Benguela, após ser nomeado pelo papa Francisco.

Os padres António Lunguieki Bengui e Fernando Francisco, nomeados em 2021 pelo papa Francisco a bispos auxiliares de Benguela, foram consagrados ao cargo na segunda quinzena de Janeiro de 2022.

“A igreja de Angola acolheu com alegria, entusiasmo e gratidão à Deus a nomeação de novos bispos da CEAST pelo papa Francisco, esta injecção de sangue novo e as sucessivas ordenações emergem como sinal inequívoco de crescimento e maturidade a igreja em Angola”, realçou José Manuel Imbamba.

Uma igreja “mais dinâmica, ágil, mais presente na vida das pessoas” e de todas as realidades socioculturais e política e “mais próxima possível dos mais desfavorecidos, dos mais pobres, das minorias étnicas” é o que augura ainda o presidente da CEAST.

Os bispos católicos defenderam hoje também a “verdade, justiça e transparência” na preparação das eleições gerais, previstas para Agosto próximo, e exortaram todos os cidadãos a participarem do processo com “alto sentido de responsabilidade” e a “evitarem absentismo”.

“O ano de 2022 é o ano das eleições para a consolidação da nossa democracia ainda jovem e débil embora já com alguma história no tempo. A democracia fortificada contribui, por sua natureza, indubitavelmente para a afirmação da dignidade humana, o reforço da justiça, da paz e do bem-estar entre os cidadãos”, afirmou José Manuel Imbamba.

Segundo o prelado católico, a sociedade “aguarda com expectativa” estes acontecimentos (eleições gerais). Mas, ao mesmo tempo, assinalou, “apelo a todos os cidadãos, dirigentes e dirigidos, políticos e sociedade civil a um alto sentido de responsabilidade, por isso renovo o convite a todos participarmos das eleições, pois é um dever cívico”.

Os católicos “devem evitar o absentismo, todos devem ter ou renovar o cartão de eleitor. As eleições hão-de correr como queremos se forem bem preparadas na verdade, transparência, honestidade e justiça”, realçou o prelado.

Para o sucesso das próximas eleições gerais em Angola, “há que se investir, uma vez mais e com paciência, na educação cívica dos cidadãos, a educação para a democracia cultiva-se”.

“Todos temos o direito de promover aqueles valores acima de toda e qualquer disputa política, tais como a boa convivência, a tolerância, a fraternidade, o amor ao próximo, o respeito pela opinião alheia, a abertura permanente ao diálogo, a irmandade, a paz, acima de tudo a nação, a cidadania e o bem-estar para todos”, exortou.

José Manuel Imbamba entende, por outro lado, que a campanha eleitoral, visando o pleito de Agosto, “só será bem-sucedida se for baseada no respeito mútuo e todos os partidos reconhecidos tiverem o direito e a oportunidade de expressar o seu ideário”.

“Sem excessos e cegos fanatismos, que geram o clima de crispação, rixas, medo, incerteza e falta de confiança no futuro, sejamos construtores de pontes e não de muros de separação, façamos render as nossas inteligências não para maquinar o mal, o ódio, a intriga, a calúnia, a exclusão”, notou.

O presidente da CEAST reprova também os “discursos musculados e incendiários, e tantos outros horrores hostis à sã convivência”, no decurso da campanha eleitoral, defendendo a necessidade dos actores políticos “lerem os sinais dos tempos e interpretá-los à luz da sabedoria e humildade”.

“Por Angola todos nós devemos sentar-nos para nos ouvirmos, por Angola todos nós devemos nos despir das nossas diferenças para termos a única vestimenta que é Angola, a nossa pátria que tanto amamos e que queremos ver brilhar”, defendeu.

Em relação à Igreja Católica angolana, o também arcebispo de Saurimo assinalou a vivência do primeiro ano do triénio dedicado à criança, a nível da CEAST, referindo que a ocasião é oportuna para reflexão profunda sobre a criança na igreja e na sociedade.

“Ela (a criança) de facto é a garantia do futuro da igreja e de qualquer nação, por isso os cuidados para com ela representam prioridade absoluta, é por isso também que a pastoral da criança é das mais importantes da igreja”, realçou José Manuel Imbamba.

A “pobreza, a falta de assistência médica, de escolas, os vários abusos, de que as vezes é vítima, a fome, a desnutrição constituem alguns dos males que nos preocupam a atentam contra sua identidade e dignidade e comprometem o futuro da sociedade”, rematou o arcebispo angolano.

Folha 8 com Lusa

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